Abrunhosa e Camané cantam a dor da emigração em Portugal

«Para os Braços da Minha Mãe» é um dos temas do novo disco de Pedro Abrunhosa, e, apesar de não ser um dos singles oficiais, já começou a passar pelo ouvido de muitos portugueses. Primeiro, pelo dueto com Camané, e depois pelas palavras de uma canção que aborda o momento social e económico difícil que Portugal atravessa e que força muita gente a emigrar.

«Esta canção surgiu num momento duro do país, em que as pessoas têm de sacrificar o melhor que têm – o amor pelos seus, pela sua terra – para irem procurar uma vida melhor [no estrangeiro]. Porque aqui, claramente, nesta altura, está muito complicado», contou Pedro Abrunhosa .

Foi exatamente a pensar na voz do fadista que Abrunhosa descobriu a peça-chave nesta canção, uma das últimas a serem completadas no final do disco.

«Quando eu acabei a letra e a música – que foi bastante rápido, em duas ou três horas – achei que a voz do Camané estava lá, estava oculta. Achei que a voz do Camané fazia parte daquele texto», recordou.

«A voz do Camané é uma voz com cicatrizes, é uma voz com rugosidades da vida, é uma voz comovente. E, portanto, quando o Camané chega e interpreta a música, eu acho que a coisa fica finalmente completa.»

O convite de Pedro Abrunhosa foi fácil de aceitar, admitiu Camané, uma vez que a empatia com a música e a letra deste «Para os Braços da Minha Mãe» foram quase imediatas.

«A canção é lindíssima e é uma canção que eu gostei imenso de cantar porque gosto imenso destas palavras e gosto imenso da melodia também. Foi muito bom».

No novo álbum, «Contramão», Pedro Abrunhosa volta a refletir sobre Portugal e o mundo em seu redor, e o músico portuense explicou que não conseguiria fazer canções de outra forma mais leve e desprendida da realidade.

«[“Para os Braços da Minha Mãe”] fala de amor, fala da partida, da despedida, da dor, da ausência… Infelizmente, a dor é mais comum entre as pessoas do que a alegria. E, portanto, a canção não serve para nada a não ser para cumprir este papel de unificação. Mas também de não deixar esquecer que o país atravessa um gravíssimo momento», explicou.

«Daqui a uns anos, no futuro, ter passado por este momento, enquanto criador, e não ter refletido o momento na minha obra… seria porque eu estava a fazer variedades e não música.»

A letra de «Para os Braços da Minha Mãe»:

Cheguei ao fundo da estrada,
Duas léguas de nada,
Não sei que força me mantém.
É tão cinzenta a Alemanha
E a saudade tamanha,
E o verão nunca mais vem.

Quero ir para casa
Embarcar num golpe de asa,
Pisar a terra em brasa,
Que a noite já aí vem.

Quero voltar
Para os braços da minha mãe,
Quero voltar
Para os braços da minha mãe.

Trouxe um pouco de terra,
Cheira a pinheiro e a serra,
Voam pombas
No beiral.
Fiz vinte anos no chão,
Na noite de Amsterdão,
Comprei amor
Pelo jornal.

Quero ir para casa
Embarcar num golpe de asa,
Pisar a terra em brasa,
Que a noite já aí vem.

Quero voltar
Para os braços da minha mãe,
Quero voltar
Para os braços da minha mãe.

Vim em passo de bala,
Um diploma na mala,
Deixei o meu amor p’ra trás.
Faz tanto frio em Paris,
Sou já memória e raiz,
Ninguém sai donde tem Paz.

Quero ir para casa
Embarcar num golpe de asa,
Pisar a terra em brasa,
Que a noite já aí vem.

Quero voltar
Para os braços da minha mãe,
Quero voltar
Para os braços da minha mãe.